“Meu nome é Adriana, tenho 34 anos e sou do interior de São Paulo. Ficar grávida de gêmeos univitelinos (mono/di) não vou negar que foi um susto enorme, pois além do “susto” normal que acho que toda mãe de gêmeos tem ao descobrir que vai ter que administrar tudo em dobro, a minha gestação foi uma gestação muito pensada e avaliada junto a alguns especialistas, pois eu sou portadora de mielomeningocele. Em decorrência desta má formação, minha gestação deveria ser acompanhada bem de perto e quando eu engravidei naturalmente de gêmeos, quase matei meu ginecologista do coração.
A gestação foi acompanhada bem de perto pelo meu médico (e posso dizer anjo da guarda) e por um especialista em medicina fetal, pois era preciso diminuir ao máximo as chances de complicações tanto da minha saúde, quanto dos bebês. Uma das minhas grandes preocupações era se os meus bebês apresentariam essa mesma má formação e graças a Deus descartamos a mesma através dos exames morfológicos. Tivemos alguns cuidados como a realização de cerclagem, acompanhamento com um especialista em medicina fetal e execução de exames de urina quinzenais, pois infecções urinárias é bem comum em portadores de mielomeningocele e a infecção urinária na mulher grávida pode levar à antecipação do parto, com riscos adicionais de dano ao bebê próprios da prematuridade.
Tudo corria bem até o segundo morfológico, mas no dia 25 de Novembro, estava tendo muita dor na coluna e para respirar, por isso acabei ficando de repouso nos dias que seguiram. No dia 29 de novembro de 2018 fizemos um ultrassom no qual foi diagnosticado a síndrome da transfusão feto fetal (STFF) grau 1, e no sábado realizamos novo ultrassom e já havia evoluído para grau 3. Após o diagnóstico foi decidido pela internação para acompanhamento da situação dos bebês através de ultrassom.
Todos os dias que fiquei internada, até o nascimento deles, foram realizados ultrassom, contudo cinco dias depois da internação, foi sinalizado que havia chegado a hora de trazê-los ao mundo pois alguns dos parâmetros que eram avaliados neste exame estavam muito fora do esperado e havia risco para os bebês. Além disso, a equipe médica havia decidido, por não realizar qualquer intervenção intrauterina, que é uma das opções para esta síndrome.
O nascimento dos “piticos”, que é como eu os chamo desde que os vi pela primeira vez, foi no dia 06 de Dezembro de 2018, com 25 semanas de gestação. Confesso que neste dia chorei muito, e posso dizer que jamais imaginei que tinha tantas lágrimas, sabia dos riscos que eles corriam e havia pesquisado um pouco sobre prematuridade e era assustador.
A cesárea não foi fácil, já que havia um complicador, só poderia ser realizado o parto com anestesia geral, devido a mielomeningocele. Eu já sabia desde que engravidei que não teria a emoção de qualquer outra mãe de ver o bebê assim que ele nasce, de escutar o chorinho e tirar a tão sonhada foto. Eu havia planejado e delegado essa função de registrar esse momento a meu marido e minha irmã, mas ninguém pode entrar na sala de parto.
O papai viu os bebês assim que eles foram colocados na incubadora e até hoje não sei se ele sabe descrever exatamente o que sentiu, pois tenho certeza que foi um misto de emoções. Nossos piticos, Diogo (G1) e Lucas (G2), nasceram respectivamente com 680g e 530g. Foram entubados assim que nasceram e imediatamente encaminhados para UTI Neonatal.
O nosso primeiro encontro jamais será possível descrever através de palavras, mas pode-se dizer que foi um misto de alegria, medo, esperança, gratidão e dúvidas. O encontro só foi acontecer na manhã seguinte ao nascimento. Eu não pude pegar eles nos meus braços, antes mesmo de tocar neles era necessário seguir um procedimento de entrada na UTI, por isso que as mães de UTI aprendem a amar seus bebês através da ponta dos dedos e simplesmente por olhar através do vidro da incubadora. Naquele dia tive certeza que estava iniciando um outro capítulo das nossas vidas, o qual não seria nada fácil ou curto, mas por algum motivo eu tinha fé de que tudo seria resolvido por milagre.
As semanas foram passando na UTI Neonatal, e descobri que não tinha diferença se era segunda, sábado ou Natal, eu estaria lá dentro do hospital. As primeiras semanas foram muito difíceis, pois eu também lutava e forçava meu corpo para entender que ele podia e devia produzir leite materno. E depois de muita persistência e dedicação, no dia de Natal consegui finalmente iniciar o processo de ordenha no hospital, então foi iniciava a rotina de visitar a sala de ordenha a cada 3 horas no mínimo.
Nas primeiras semanas também decidi que eu não contaria os dias de UTI e que as notícias sobre o estado de saúde deles seriam somente enviadas por mim, então estabeleci uma rotina de mandar um “resumo da semana” aos familiares e amigos, pois assim eu selecionava e filtrava o que eu queria contar, bem como reduzia a quantidade de mensagens recebidas por WhatsApp. Foi a melhor estratégia de comunicação que funcionou para minha família e tenho certeza que todos recebiam esses “resumos” ficavam ansiosos pelas mensagens todas as quintas-feiras.
Como previsto eles ficaram muitas semanas internados. O Diogo ficou 15 semanas (106 dias) e o Lucas 22 semanas (158 dias) internado. Neste período eles foram fortes, sapecas, guerreiros, e verdadeiros milagres. Falei que não contava quantos dias eles estavam no hospital, mas acompanhava semana a semana cada ganho de peso, cada superação, cada redução do percentual de suporte de oxigênio. Na verdade, eu até contava os dias para então poder finalmente colocar eles nos meus braços e aguardava ansiosamente pelo dia da amamentação e pela “promoção” para o berço.
Primeiro veio o tão esperado momento do colinho que chegou com 63 dias para o Diogo e 70 dias para o Lucas, foi uma delícia e uma emoção enorme!!! Outro momento tão esperado foi de vê-los respirando sem o tubo, eles ficaram 89 e 124 dias entubados, respectivamente. Sair do tubo significava banho, berço, roupinhas, colinho da mamãe e do papai e poucos passos para ir para casa.
Uma das perguntas que mais fazem para os pais de prematuros são relacionadas a intercorrências, diagnósticos durante a internação e as temidas sequelas. No caso dos piticos a lista de intercorrência e diagnósticos é longa, incluindo: inúmeras transfusões (chegou num ponto que parei contar), sepse, choque séptico, hemorragia intracrania grau III, icteria, doença da membrana hialina, broncodisplasia pulmonar, anemia, doença osteometabólica, plaquetopenia, hipospádia, pneumonia, etc. Além da lista citada, vale ainda mencionar que durante o período de internação o Lucas fez a cirurgia para fechamento do canal arterial quando ainda pesava somente 720g e ambos fizeram a cirurgia da hernia inguinal com aproximadamente 100 dias de vida.
O momento de ir para casa foi outro desafio porque o Diogo
saiu praticamente 1 mês e meio antes do Lucas, então tive que me desdobrar para estar nos dois lugares e a cobrança que eu tinha para comigo mesma era enorme, pois queria estar presente em casa para o Diogo e ao mesmo tempo sabia que estar no hospital era importante para o Lucas.
Foram dias complicados e que tenho certeza que só sobrevivi porque minha rede de apoio era sensacional. Meu marido, pais e irmã foram essenciais para manter a minha sanidade mental e física, bem como para cuidar do Diogo enquanto eu ficava com o Lucas no hospital. O Lucas teve alta do hospital dia 13 de Maio de 2019 e foi para casa com suporte de oxigênio, portanto mais um desafio para a lista, pois tivemos que fazer o desmame de oxigênio em casa com acompanhamento da pediatra e fisioterapeuta.
Em casa os cuidados continuaram seguindo sempre as recomendações da pediatra neonatologista (amo demais a pediatra dos piticos). Para suportar o desenvolvimento deles, eles fazem fisioterapia motora e respiratória desde que receberam alta (isso fez uma diferença evidente) e seguem acompanhados por diversos especialistas (neurologista, pneumologista, oftalmo e cardiologista). Hoje eles já completaram 11 meses de vida (idade cronológica) e já tiveram alta do cardiologista (eba!), mas ainda mantém o acompanhamento com demais especialista a cada 3 meses e tenho certeza que todos esses cuidados e o fato de serem um milagre mediante a tudo que passaram, permite que eles estejam se desenvolvendo tão bem, estando de acordo com a idade corrigida deles que é de 7 meses e meio. Para os próximos meses estamos aguardando a avaliação da cirurgiã pediátrica para realizar uma pequena cirurgia da hipospádia e a festinha de 1 ano.
O desafio foi grande, mas vê-los hoje saudáveis, espertos e ativos é o maior presente, o que acaba fazendo com que qualquer momento de dor e medo que enfrentamos nesse longo caminho signifique que vencemos uma etapa. Para todas a famílias de prematuros meu conselho sempre foi e sempre será que respeite o tempinho deles, tenha fé acima de tudo, entenda que todo dia é um novo dia, que milagres são possíveis sim e que as adversidades são apenas um mero detalhe mediante a coisas boas que irão sorrir para vocês. Acreditem!!!
Leia também aqui na Me Two sobre este assunto:
@@ O QUE É SÍNDROME DE TRANSFUSÃO FETO FETAL? – COM DR. WAGNER HERNANDEZ
@@ RELATO – MÃE DE GÊMEOS PREMATUROS – Por Tanani Munari
@@ #NOVEMBROROXO: O QUE TODA MÃE DE GÊMEOS PRECISA SABER SOBRE PREMATURIDADE
3 Comments
Toda a família viveu, mesmo que à distância, as emoções, angústias, esperança e fé com a Adriana. Hoje temos a certeza que são verdadeiros milagres , mas a excelência dos profissionais que os atenderam fez muita diferença para que hoje estejam saudáveis e lindos.
Olá.
Sou Renata tenho 49 anos..Vivi algo parecido tenho uma bebê prematura estrema…Hoje ela tem 6 meses de vida 3 meses corrigindo…
agora estar sendo acompanhada com fisioterapia, nutricionista, T.O e fono.
Dri, muito obrigada por compartilhar esses momentos da vida de vcs! Fico muito emocionada e tenho certeza que a sua positividade e leveza poderao ajudar muitas pessoas que estão passando pela mesma situação. Parabéns pela maneira que vcs venceram os obstáculos e estou ansiosa para ter a chance de conhecer seus piticos!!